domingo, 30 de novembro de 2008

Destrago.

Li demais cara, li até o que eu não deveria ler e fingi ler o que deveria ter lido. E fumei demais, e eu nem trago tão bem assim, aliás eu só gosto do sabor do cigarro nos lábios como distração, como companhia ás vezes, e eu não te traguei como eu lhe dizia enfaticamente. Até ligava para te avisar, mas veja só que patética eu sou (ou que patética eu voltei a ser, ou evito ser).
Tentei
juro que eu tentei de tragar. Traguei, tossi e assim ia tentando com certa inutilidade.

Ah cara, acho que eu te TRAGUEI DEMAIS, foi isso. E tanto ter tragado outros, fui acumulando vários cânceres, miásmas pelo corpo e pela mente. Até na alma acho que já tive um câncer. E é isso, você sabe,
tenho medo de mais um, eu sinto ele ir nascendo, é bem leve, quase imperceptível, eu quase posso acariciá-lo
(isso porque eu digo sou saudável, olhe como eu ainda tenho forças para continuar isso.Olha como eu ainda sei sonhar,não é incrível?)


Hoje eu acordei com um gosto de cigarro nos lábios & decidi que eu ia parar de fumar por um bom tempo.

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Em algumas horas

Não há qualquer honra em esperar em vão as horas serem exatamente aquelas que deveriam ser, e não são.
(Hermamm Hesse)





Então é madrugada
de novo
como sempre e mesmo que amanheça ainda será madrugada neste espaço minúsculo onde
eu deveria carregar um coração mas ele deve e provavelmente está enterrado como o de seth então quem o encontrar terá em suas mãos algo inútil e terá o poder de acabar com toda essa inutilidade & eu irei sorrir a contragosto e porque eu gosto sim de sorrir quando nada faz sentido porque isso não faz sentido
mas é
madrugada e estão todos ao meu redor e eu não sou eu
sou outra pessoa até melhor porque ela é fria mais fria do que o tempo que está lá fora e que nenhum relógio
QUE DELIRA
marca nos ponteiros
essa falta quase que ardente, que rasga & que esvazia os meus olhos algumas vezes que eles deveriam
sei lá
observar o quanto isso tem sido patético para mim mas ao mesmo tempo único & e doce
tão doce que eu sei
ah mas eu sempre sei, como se Delphos fosse logo ali
que vai acabar, como sempre acaba, como sempre se acorda de um sonho para a realidade
(este sonho que fuma loucamente e que diz que vai me esperar)
assim como são 6 horas e já não é madrugada.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Blues sugar Blues

He's not much on looks
He's no hero out of books
But I love him
Yes, I love him
(Billie Holiday- My man)




Retiro com pressa e avidez de uma amante insaciável os teus versos sujos & as tuas prosas doentias e vou desabotoando um por um esses teus complexos de cão solitário que vaga pela madrugada quase rasgando o teu alcoolismo vagabundo enquanto meus dedos vão procurando os teus antigos amores que vá lá saber
se realmente são antigos ou se foram de fato amores & os meus lábios vão se aprofundando nos teus lábios mofados de blues, doce blues e vão se perdendo em seu pescoço,
sugar blues
& vão de aproximando de toda a inspiração,
blues sugar blues
ali onde meus lábios não vão ser lábios mas apenas dois leves pedaços de carne, porque nossos corpos vão
ser apenas carnes sobrepostas,
carnes que se invadem,
que se machucam freneticamente e não sentem dor
mas nós,
eu digo isso que é mais do que carne & sangue & fluídos,
seremos massa incorpórea, notas que vagam pelo ar saídas de uma guitarra, gaita, sax, seja o que for,
seremos jazz & blues
poesia mon amour em corpo de poema.

domingo, 23 de novembro de 2008

Volvió una noche

Não merecemos estar aqui, entre tantas e tantas pessoas que só nos fazem nos sentir cada vez mais e mais sozinhos e abandonados dentro de nós mesmos e por isso, e somente por isso aceitei ser conduzida por você entre todos aqueles bêbados e alienados patéticos para fora daquele mundo em que somos apenas estranhos de passagem. Não digo o seu nome e nem dirás o meu, talvez você seja aquele que realmente amo e talvez eu tenha sido aquela que você tenha abandonado, mas por hoje, por essa noite, não vamos ser ninguém além de dois perdidos numa cidade repleta de muros impenetráveis.Rasgamos a noite com esses nossos sorrisos amarelo-doentio que caem pelo gramado molhado e morto como todos esses sonhos idiotas que idealizam amores perfeitos( orquídeas para mim e lírios para você), esse amor mais que perfeito do presente e do passado. Eu vomito sobre você todos os meus antigos amores enquanto os seus lábios abrem os meus lábios num soluço interminável.Abraça-me entre tuas pernas & diga por favor que todos os tangos serão para nós, apenas por hoje e eu lhe direi o quanto eu te amo por esta noite, e só por esta noite, antes que os meus cigarros acabem, antes que o nosso vinho acabe,
Del fondo de mi copa, su imagen me obsesiona

antes que eu saiba quem você é e você saiba quem sou.

Mentira mentira, yo quize decirle
El tiempo que pasa ya no vuelve más

O que eu amo, o concreto convulciona para dentro de si, para longe de mim, para além do que eu sinto com estes meus olhos de tráfego.

Toque o meu peito e rompa meu coração incendiado de tudo isso que jamais teremos.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Garoa de moedas (ou um poema vagabundo após ler Piva)

Entre as gotas
impuras
puras putas
que caem do céu
e molham assim as páginas do Piva que
eu não sabia
você está ali em cada verso
e é talvez por isso
que chove agora na merda do meu coração.

O meu rosto que se esconde dentro dele mesmo
que foge do reconhecimento alheio
que odeia reconhecer coisas alheias a ele próprio
(que se descobre de si, todas as manhãs, sem maquiagens, sem máscaras)
corre pela rua, não quer se molhar
derreter e revelar quem eu sou.
Oras, mas chovia no teu coração de merda
e talvez por isso eu tenho medo de me molhar.

E pelo caminho, esbarro, caio
tropeço e me levanto
entre
carros tocando velhas canções de rádio
mas que eu só queria
ouvir a tua voz sobreposta a essas velhas canções
e os seus olhos encontrando as minhas imperfeições
e sorrindo
porque elas completariam as tuas imperfeições
que são perfeitas.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Nem tenha um título, por não querer ser nomeado.

Sei que fazer o inconexo aclara as loucuras. Sou formado em desencontros. A sensatez me absurda. Os delírios verbais me terapeutam. Posso dar alegria ao esgoto(palavra aceita tudo).(E sei de Baudelaire que passou muitos meses tenso porque não encontrava um título para os seus poemas. Um título que harmonizasse os seus conflitos. Até que apareceu Flores do Mal. A beleza e a dor. Essa antíteseo acalmou.) As antíteses congraçam.

(Manuel de Barros)



Começo assim.


O alcançaria em meu voô noturno em plena claridade desta cidade inundada de escuridão, à contramão de mim mesma, dexisplicável ave de rapina com asas de borboletas e olhos de morcego que se esbaqueia, se esfaqueia rumo a ti. Tu que não te moves de ti, eu que não me movo de ti. Disperço meu tempo, apresso meu desvelo, que ora é apenas as cinzas desses meus amores-cigarros ( eu que não fumo), ora restos dos meus sonhos-copos-com-qualquer-alcool( eu que não bebo).
Sobrevoo estas flores que, não sei, sejam pedras-palavras tuas balas tão suaves que não matam, que atingem e escorrem pelo meu corpo como sangue quente, de feridas nossas, e que os meus lábios lambem para que, no encontro com os teus, acabem tendo todos os significados que deveriam ter (e que talvez não o tenham).

Continuo.
Tome fôlego (ou qualquer coisa que custe 4,50 em um bar)

Encontro-o derretendo-se em algum cruzamento da vida-grande cidade-imunda em que a chuva, essa tão idiota chuva ( lembre-se de Ben Jor Jorge, chove chuva, chove sem parar. Continue a letra e lá encontrarás o que digo), mas é você, enfim, a imundice dos meus olhos e a pureza do meu amor (Se não o fosse, São Paulo seria pura quase santa de tão exata em seus cruzamentos, mas, não é).

Talvez piedade, amor piedade.

Abraço-lhe com minhas asas multifacetas-multicoloridas-multidoloridas que vão se rasgando, pedaços que os bueiros vão escoando junto com isso, que diríamos, poderia ser algo como o meu parco amor próprio (mas não dizemos, estamos mudos, a chuva molha nossa voz).
Então nascem meus braços, meus olhos tem lentes e estou tão abaixo dos céus que nenhuma consolação é o bastante para o inferno que será chegar até o paraíso.

sábado, 8 de novembro de 2008

Kevin Carter


Acordou de repente, com o coração acelerado. Exagerou na última carreira e na superdosagem de heroína na noite passada. Mas era aquele sonho, aquele MALDITO sonho que o perseguia, tinha certeza disso. Antes fosse um mero sonho e não um flash, um flash que havia acabado com sua frágil normalidade. Estava suando apesar da noite fria. Precisava de alguma coisa, qualquer bebida, talvez cocaína, algo forte, mais forte do que ele, mais forte do que ela, aquela menina, aquele flash. Queria chorar, se recolher em posição fetal no chão imundo da sua casa, se sentia humilhado. Não pelas contas a serem pagas e nem pelos seus exageros em drogas e álcool, tão criticados por seus colegas da profissão. Estava pouco se fodendo agora para isso. Só queria chorar por ele e por aquela menina. Ela que lhe rendeu a maior glória da sua vida e lhe jogou diretamente para o escárnio, a lama, a podridão, até onde um homem pode chegar numa escala de humilhações que passam de todos os limites. Seu Pulitzer, na estante, sempre o lembrando de seu brilhante profissionalismo, ética e objetividade. Queria enfiar tudo aquilo no de todos aqueles malditos críticos que lhe deram aquela porra.


Se olhou no espelho e só via ela, rastejando por comida, abrigo ou qualquer coisa. Claro que poderia ser qualquer coisa, ele se sentia o maior filha da puta do mundo por não ter lhe perguntado o que queria. O melhor enquadramento, era só isso que ele queria. Ele era um predador, mais um urubu na cena.Maldito, se odiava por isso.


Ele não queria isso, a grande verdade seja dita. Ela apareceu ali, quase implorando por aquela foto, que culpa ele teria? No fundo achou que aquela foto a ajudaria muito mais do que leva-la até aquele abrigo da ONU, tinha certeza disso. Ele só queria fotografar a guerra, era um jovem pacifista, o Sudão em uma guerra civil perdida, o mundo todo cego a ela. Queria sim horrorizar os jornais com aquelas cenas, queria que todos soubessem daquilo, que suas fotos fossem balas, gritos, o crepitar de corpos em meio a fogueira. Era isso.A menina apareceu porque queria que isso fosse mostrado da maneira mais cruel possível. Se sentiu orgulhoso por ter conseguido o que mais queria afinal. Era um membro do bang bang gang, sentia-se orgulhoso por ter mostrado ao mundo o inferno do apartheid, a libertação de Nelson Mandela e tantas outras atrocidades políticas em sua África. Colocou a sua vida em segundo plano, pelo amor ao fotojornalismo, por amor a verdade. O mundo precisava deles. Oosterbroeck estava morto; uma bala perdida cravada em seu peito e sua câmera ensanguentada, Marinovich; sete cirurgias, mais um câmera ensanguentada. Sabia que era injusto, que todos os que o aplaudiram por sua coragem e por sua competência, agora, o repudiavam, riem as suas costas por sua situação humilhante. Sádico e desumano, era isso que todos disseram após a foto ser publicado no New York Times.

Talvez o fosse, porque não? Maldito egoísta.

Encontrou nas drogas e no álcool algo em que acreditar, algo que o fortalecesse, que o fizesse esquecer daquela menina. Encontrou nela muito mais do que um prêmio e uma denuncia. Encontrou nela aquilo que em breve seria.


Não, jamais haveria alegria naquele sorriso.

ASSASSINO, escrito em sua testa. Era apenas isso que ele lia todas as vezes que se olhava em algum espelho, em alguma lente.

Ele queria ter a salvo, mas não foi forte o suficiente para isso.
Queria ter se salvo.


"Eu estou depressivo…sem telefone…dinheiro para o aluguel…dinheiro para o sustento das crianças…dinheiro para as dividas…dinheiro! Eu estou sendo perseguido pela viva memória de matanças, cadáveres, cólera e dor…pelas crianças famintas ou feridas…pelos homens loucos com o dedo no gatilho, mesmo policiais, executivos assassinos…”

Trecho da carta de despedida de Kevin Carter

Fotojornalista sul-africano suicidou-se após anos registrando a miséria humana

Johannesburgo, 27 de julho de 1994.


Suicída-se o fotografo Kevin Carter.

O corpo fo encontrado próximo a um lago em sua cidade natal,Johannesburgo,África do Sul, dentro do seu carro. A morte foi provocada por inalação de monóxido de carbono.

Kevin Carter foi o grande ganhador do Prêmio Pulitzer deste ano, pela foto em que mostrava o horror da guerra do Sudão através do sofrimento de uma menina sendo devorada em vida por um abutre.Kevin era membro da renomada bang bang gang. Grandes jornalistas que arriscavam suas vidas para mostrar ao mundo que de fato ocorria em todo o continente Africano.
(Conto Baseado na música "Kevin Carter-Manic Street Preachers" e na reportagem do blog "Revista Wave")
http://www.revistawave.com/blog/index.php/2008/02/20/kevin-carter-1960-1994/

PORQUE NÃO PODEMOS DEIXAR QUE ISSO SEJA ESQUECIDO.



PS: Não estou aqui de maneira alguma defendendo a causa humanitária. Não que eu seja fria o bastante para isso, mas enfim. O texto é uma forma de protesto contra a injustiça cometida contra Kevin Carter e o seu precoce esquecimento.