sábado, 18 de junho de 2011
Paulistanagens #4
Nas unhas um esmalte roído datado da semana passada, em acessos de ansiedade crônica após ter desistido dos cigarros. O café continuaria, doses homeopáticas pela manhã enquanto o marido recitaria as manchetes da Folha de São Paulo e ela fingiria algum interesse pela Dow Jones. O casamento a envelhecera apesar da aparência ainda jovem, com as promessas de noites deitada no sofá importado da França acompanhando as séries da tv paga com doritos espalhados pelo decote da camisola de seda chinesa. As amigas ligavam, contando sobre seus casos durante as inúmeras festas que ela nunca mais seria convidada, persona non grata com sua vida nos eixos, contas pagas e a tranquilidade de quem pode dormir sem o peso das escolhas, apenas o peso do anel de ouro e do diamante que guardaria consigo eternamente seus pensamentos. O marido não mais a impressionava, peso morto sobre seu corpo em algumas noites em que ao fechar os olhos era com outros que fingia o orgasmo. Mas o amava, como amava a programação matinal da tv ou como as revistas femininas espalhadas nos salões de beleza que freqüentava. Um amor sem sentido e sem senso de realidade de uma vida igualmente assim, com cartões de crédito sem limites que jamais comprariam na Oscar Freire a felicidade, que é de graça, e que por ser assim, nunca a interessaria.
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2 comentários:
Não sei se foi esse o seu objetivo, mas através de um relato cotidiano de uma moça de família (ou casamento) "privilegiado", seu texto mostra que a felicidade está tão somente dentro de nós.
puxa, acabei de escrever uma prosa pessoalíssima sobre o interior, e lendo seu texto ficcional em terceira pessoa num contexto tipicamente metropolitano me encantou, principalmente a pluralidade dessas linguagens. puxa, que legal coincidência. Vou andar de bicicleta com uma camiseta escrito "Amém ao acaso!", hahaha.
um abraço.
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